segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

A Biblioteca à noite


Alberto Manguel foi leitor de Borges, o escritor argentino que deveria ter recebido o Nobel da literatura, mas não recebeu. Em 2013 a “Tinta da China”, publicou um livro curioso de Manguel e Guadalupi, que nos dá sempre um prazer enorme de consulta quando necessário: “Dicionário de lugares imaginários”.
Manguel é um bibliófilo do “catano”. A sua mítica biblioteca pessoal possui cerca de 40 mil volumes (ou mais). E dessa biblioteca transporta-nos para o mundo dos livros, de sonhos remotos ou actuais. Para o mundo enigmático e fascinante das bibliotecas na história do mundo.
A sua actual biblioteca, diz-nos logo nas primeiras páginas, foi um templo dedicado a Dionísio no tempo dos Romanos, e no século XV foi um celeiro de uma pequena colina do sul do Loire. E desse antigo pequeno celeiro, Manguel revisita Lucano no século I descrevendo Júlio César caminhando pelas ruinas de Tróia. Á noite, folheando esses livros, recordam-se fábulas remotas orientais como a de Zadig e cidades míticas como Samarcanda. Mas também se folheiam obras mais recentes como as de Voltaire.
E nas conversas com os seus amigos, Manguel diz-nos que a biblioteca de Montaigne ficava no terceiro andar da sua torre, num “antigo espaço de arrumos”. Ali havia passado a maior parte dos dias da sua vida, mas nunca lá esteve de noite. Ao contrário de Manguel que frequenta a sua de noite, na companhia de Keats, Virginia Woolf e tantos outros, sem esquecer Hermann Hesse ou Walter Benjamin. Ou Safo, a poetisa grega de Lesbos, ou Chalamov e os seus contos de Kolimá.
De lá avistamos a mítica biblioteca de Alexandria, ouvimos as suas histórias (contadas por Estrabão) e observamos a sua destruição. Ou a de Pérgamo que foi uma imitação da do antigo Egipto. Do nada surge Calímaco que há mais de 22 séculos havia utilizado a primeira classificação alfabética de uma biblioteca, um dos mais notáveis bibliotecários de Alexandria, poeta admirado por Propércio e Ovídio e autor de mais de 800 livros e um catálogo de 120 livros de autores gregos mais importantes da biblioteca, depois da referência à maior enciclopédia do mundo, a Yongle Dadian, encomendada no século XV pelo imperador Chengzu.
Sabemos da história de Melvil Dewey e da do antigo templo de Dionísio. Como são ordenados os livros ou os autores. Juntam-se amigos de todos os tempos, como Borges e Bioy Casares, ou Goethe e Schiller. Deles dependem a organização das várias bibliotecas como a de Lionel Johnson que inventou prateleiras suspensas no tecto, ou a de Althorp cujas estantes alcançavam alturas vertiginosas. Mas sabemos ainda das irresponsabilidades praticadas em algumas, incluindo a biblioteca do Congresso e a biblioteca Britânica, sujeitas aos “criminosos do microfilme”.
Mas as bibliotecas são acumulação de conhecimento. No ano de 764, a imperatriz japonesa Shotoku, mandou imprimir quatro dharani-sutra. E dez séculos depois, Diderot, em 1751, retomou o projecto de Shotoku com a Encyclopédia.
O livro embarca numa viagem de sonho pelas bibliotecas da Mesopotâmia do rei Assurbanípal, entre 668-633 a.C., pelas bibliotecas de Carnegie, pelas de Chinguetti em pleno deserto, pelas das grutas em Mogao, a de Adolf Hitler, ou as mais recentes burrobibliotecas das zonas rurais da Colômbia
Foi um dos melhores livros, sobre o tema, que lemos em 2016.   Armando Palavras

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