sexta-feira, 25 de março de 2016

A constatação de Walter Benjamin

 “Walter Benjamim morreu aos 48 anos, em Portbou, na província de Girona, depois de acossado pelo avanço dos nazis. Não teve a mesma sorte que outros. Não conseguiria chegar a Portugal, depois de atravessar os Pirenéus a pé. Ainda hoje os pormenores do que aconteceu não são claros. Hannah Arendt (Homens em tempos sombrios, Relógio d’Àgua, 1991), contudo, acredita que se tenha suicidado porque “não havia ninguém mais isolado do que Benjamin, ninguém tão absolutamente só”. O trágico deste episódio é que um dia antes Benjamin teria passado a fronteira sem dificuldade. “Só naquele dia era possível a catástrofe”, diz-nos Arendt.
Se homens como Benjamin, um pensador admirável, não têm morrido antes de tempo, o mundo seria, com certeza, muito melhor”.

De vez em quando retomamos os escritos fragmentários de Walter Benjamin. Discípulo de Adorno, iniciou a sua escrita como marxista assumido, como eram aliás todos os judeus de determinada “facção” da sua geração, e da sua condição social, na Alemanha de então. Mais tarde abandonou o marxismo. Destas razões não trataremos neste escrito.
O que importa agora é relacionar alguns dos seus fragmentos sobre a Moscovo de então, com o Portugal de hoje. Se o não foi, a realidade de hoje diz-nos exactamente que Benjamin foi profeta.
Em Imagens de Pensamento, no fragmento VI, diz-nos sobre a cidade de Moscovo dos anos 20 do século passado: “Cada pensamento, cada dia e cada vida se encontram aqui como sobre a mesa de um laboratório. E, como se fossem um metal do qual se tem de extrair por todos os meios uma substância desconhecida, eles têm de se submeter a todas as experiências até à exaustão. Não há organismo nem organização que se possam furtar a este processo. Reagrupam-se, transferem-se, mudam-se de lugar os funcionários nas empresas, as repartições nos edifícios, os móveis nas habitações (…).
Os regulamentos alteram-se todos os dias (…). O país está mobilizado dia e noite; à frente de tudo, naturalmente, o partido. De facto o que distingue o bolchevique, o comunista russo, dos seus camaradas ocidentais é esta disponibilidade absoluta para a mobilização. A base da sua existência é tão estreita que ele está sempre pronto a mudar de vida a qualquer momento”.
No fragmento VII, diz-nos:” O bolchevismo acabou com a vida privada. A burocratização, a actividade politica, a imprensa, são tão poderosas que não resta tempo para interesses que não coincidam com elas. Nem tempo, nem espaço (…). O lugar onde vivem é a repartição, o clube, a rua”.
E termina no fragmento VIII com o seguinte: “Qualquer cidadão de Moscovo tem os dias preenchidos ao máximo. Reuniões, comissões, são marcadas a qualquer hora (…). Existe uma espécie de selecção natural  e uma luta pela sobrevivência nessas assembleias. (…) Mas quantas vezes elas têm de se repetir até que uma delas seja bem sucedida, viável, adequada, e se realize! Nada acontece como estava planeado (…), fazem de cada dia um tempo esgotante e de cada vida um instante”.


Tornar a Benjamin (no caso português) é concluir que não melhoramos em nada desde 2005/2011, período onde se impuseram as situações descritas por Benjamin sobre a cidade de Moscovo da década de 20 do século passado. O interregno de 2011 a 2015 apenas manteve o status quo adormecido. As escolas estão cheias deste folclore. Melhorar o ensino não é criar provas disto e daquilo, aula daqueloutro, reuniões atabalhoadas, sessões, seminários, acções interesseiras. Melhorar o ensino é ir ao âmago da questão – corrigir os erros cometidos nestes últimos dez anos (durante a governação socialista de José Sócrates). Ou seja, criar uma legislação decente, colocar nos lugares os melhores e erradicar os caciques. Armando Palavras


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