domingo, 28 de janeiro de 2018

O piropo e o assédio sexual


DANIELE CAMPBELL
Quem na sua juventude não mandou um piropo a uma mulher jovem bonita? Vulgo, “gaja boa”? Quem nunca susteve a respiração, por segundos, no metro, no comboio, no autocarro, no cinema ou no restaurante, com a presença de uma mulher bela? De beleza extenuante?
Um piropo significava um galanteio para uma mulher bela. Uma “brasa” para o vulgo. Os piropos rosqueiros, eram objecto de critica, assim como o seu autor, da masculinidade em presença. Por vezes eram objecto de duas ou três lambadas por parte do irmão da beldade. Mas a maior parte das vezes eram engraçados, até sedutores.
Quantas mulheres belas sorriram, envaidecidas, com um piropo bem lançado? Algumas chegavam mesmo a desafiar a masculinidade, provocando-a subtilmente – um lance elegante na calçada com meias próprias torneando pernas proporcionais; um esticar de seios; uma mexedela de bunda, ou um sorriso maroto.
Hoje, de uma forma indecente, o piropo é classificado de assédio sexual. Assédio sexual não é nada disto, contém outros pressupostos. Um dos mais conhecidos episódios de assédio sexual (neste caso feminino!) é o protagonizado pela esposa de Potifar e Josué (Génesis 39: 3-9)
Pintura de Guido Reni
Um piropo (decente) pertence sim, a uma atitude de sedução, de galanteio. E não a esta doutrina totalitária.
KATE  SEPENCER
Por este andar, ainda hão-de proibir a boa literatura. Porque está repleta de episódios que, aos olhos desta censura totalitária, são próprios de assédio sexual. A começar pela literatura erótica oriental. Se na do Ocidente o erotismo se desenvolve entre o ódio puro e o puro amor sublime tornado sacralidade, que já existia na Grécia, tendo-se acentuado na tradição judaico-cristã, no Oriente, na China como na India, existe há milénios uma rica literatura erótica culta e refinada. Demonstra-o na Índia a difusão do Kamasutra (talvez do século III d.C.) e na China os inúmeros clássicos do erotismo, já difundidos durante a dinastia Han, onde o erotismo é sempre tratado com metáforas poéticas delicadas. O romance clássico de Li Yu “O Tapete Carnal de Oração”, é disso exemplo.
Já no Ocidente o erotismo aparece, pela primeira vez na Europa medieval em Boccacio e Chaucer, com simplicidade ordinária. No século XVIII surgem os libertinos franceses. Apenas dois exemplos, onde se exclui o Marquês de Sade:  Vivan Denon e Jean François de Bastide.
LARISSA MACIEL
Nos anos 30 do século passado, Henry Miller e Anaïs Nin, descrevem abertamente a realidade erótica, superando o tabu do sexo. As suas descrições são duras. Como o são as de Arsan em “Emanuelle”. Já nos anos 60 e 70 do século XX o faz Lidia Ravera, seguida mais tarde por Erica Jong e Catherine Millet.
E poderíamos ir por ai adiante. Pela pintura, pela dança e pelo canto. Ou por Bocage e Petrónio.

Quem se não lembra da história da bela Helena contada por Homero? Ou do poema bíblico “Cântico dos Cânticos”?
Que belos são os sonetos de Camões sobre Dinamene, ou Tin Nam Men, a jovem chinesa que lhe arrebatou o coração luso além da Taprobana.
E que dizer de Laura cantada em Rerum vulgarium fragmenta, por Petrarca?
Dante cantou Beatriz e Bocaccio, Giovanna d'Aquino.
Hoje seriam censurados por esta doutrina totalitária, que nos mostrou o Holocausto, o Gulag e o deserto de Góbi.
Que dizer da poética dos trovadores medievais e de Fernando Pessoa que dirigiu certas cartas a Ofélia Queiroz?

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