José Sócrates criou
no PS uma cultura de propaganda que permanece. Embora António Costa seja –
felizmente – muito diferente de Sócrates em variadíssimas coisas, nesse aspeto
os dois são iguais.
A festa comemorativa
do 1.º aniversário do Governo foi uma operação de marketing como nunca se viu.
Ensaiar um show para
o primeiro-ministro responder a perguntas da plateia, com todo o Governo (tanta
gente!) a assistir atrás dele, foi um espetáculo quase grotesco.
António Costa ia
passando certas perguntas para os ministros – «Senhor ministro das Finanças,
que está aí tão calado, responda a esta questão» – como se fosse um mestre de
cerimónias.
E a seguir mandou os
ministros pelo país fora, como vendedores de banha da cobra, para
propagandearem o seu trabalho. Não sei como eles se sujeitaram a tal
fantochada...
A comemoração do 1.º
ano de existência do Executivo foi, assim, a cereja no topo do bolo de uma
governação marcada por um marketing agressivo e muito eficaz (a avaliar pelas
sondagens).
Decorrido um ano
sobre a tomada de posse, o ponto da situação é este:
1. O Governo passou
a mensagem de que o rendimento das famílias aumentou.
Trata-se de uma
ilusão, pois os aumentos de rendimentos foram praticamente absorvidos pelo
aumento dos impostos e pelas subidas de preços (a inflação tem vindo sempre a
crescer desde o início do ano).
2. O Governo passou
a mensagem de que a economia cresceu muito.
é um perfeito
embuste, pois a economia cresceu no 3.º trimestre mais do que crescera no ano
passado, mas nos outros dois trimestres cresceu muito menos; e no final deste
ano vai situar-se muito abaixo de 2015 (cujo valor final corrigido foi de 1,6%,
quando este ano rondará o 1%).
3. O Governo passou
a mensagem de que recapitalizou a CGD, enquanto o Governo anterior a tinha
deixado cair.
Trata-se de mais um
engano, pois a recapitalização da CGD não foi nem será feita em 2016, passando
para 2017 (apesar de, segundo o Governo, ser «muito urgente»).
4. O Governo passou
a mensagem de que o PSD usou a CGD como arma política, prejudicando o país.
é virar a realidade
do avesso, pois quem arrastou os problemas da CGD foi o Governo, demorando sete
meses (!) a empossar a nova administração, fazendo uma lei para isentar os
administradores de cumprirem as obrigações legais, e finalmente revelando-se
incapaz de os obrigar a entregar as declarações de rendimentos – facto que os
levou à demissão.
5. O Governo passou
a ideia de que, no meio de todas as dificuldades, ainda pagou ao FMI,
substituindo dívida mais cara por dívida mais barata.
Passou-se o
contrário: o Governo pagou muito menos ao FMI do que o previsto. Estava
planeado para este ano um pagamento de 6,6 mil milhões de euros, que foi adiado
pelo facto de uma parte (2,7 mil milhões) ser usada para recapitalizar a CGD.
Mas a recapitalização não se fez – e o Governo, em vez de pagar ao FMI os 6,6
mil milhões previstos, só pagou 2 mil milhões.
Uma última nota,
muito sintomática.
Em 24 de outubro,
António Costa anunciou um grande empreendimento para Lisboa.
Só que, além de ser
uma iniciativa da CML e não do Governo (devendo ser anunciada por Fernando
Medina), a operação ainda não tinha sido aprovada pela Câmara Municipal de
Lisboa quando Costa a anunciou!
O primeiro-ministro
antecipou-se à própria entidade a quem cabia decidir.
A denúncia foi feita
aqui no SOL por Sofia Vala Rocha e ninguém reagiu.
Como este exemplo,
há vários.
Para o Governo, 2016
foi um ano de propaganda e de virar as questões ao contrário, atirando as
culpas para os adversários – arte em que Sócrates também era exímio.
Além disso, adotou
uma atitude pública invulgar, apresentando-se muitas vezes como a ‘oposição da
oposição’.
O Governo e o PS
ocuparam mais tempo a atacar Pedro Passos Coelho e o PSD do que a defender a
sua política.
Os ataques de Carlos
César e António Costa a Passos Coelho ultrapassaram por vezes os limites
do razoável.
E os seus parceiros
de ‘coligação’, o BE e PCP, preocuparam-se mais em atacar ‘a direita’ do que em
defender o Governo.
Diziam (e dizem)
constantemente: «A direita isto, a direita aquilo…»; a direita, embora já não
seja Governo, continua a ser o papão.
No tempo da troika,
não me lembro de ouvir o Governo, o PSD ou o CDS atacarem tão obsessivamente o
PS (apesar de este flagelar Passos Coelho por cumprir o memorando da troika que
o Governo do PS assinara).
Passos Coelho era
atacado quando estava no Governo – e continua a ser atacado na oposição...
Além da formidável
propaganda que fez de si próprio, este Governo verdadeiramente não fez nada.
A única coisa que
fez foi reverter o que o anterior Governo tinha feito.
Reverteu as
privatizações dos transportes (incluindo a TAP), reverteu os cortes e as sobretaxas,
reverteu o IVA da restauração, reverteu as 40 horas na Função Pública, reverteu
os feriados, reverteu os exames, vai reverter o fecho dos tribunais.
Foi um Governo que,
em lugar de fazer, desfez.
E, na sua
propaganda, contou com cumplicidades importantes.
Contou, primeiro,
com a cumplicidade do Presidente da República: nunca um Governo teve um apoio
tão explícito por parte de um PR como este tem tido.
Contou com a
cumplicidade da CGTP – que aceitou não fazer barulho nem manifestações.
Contou com a
complacência dos media (compare-se a atitude da comunicação social em relação a
este Governo e ao Governo anterior) e com a cumplicidade de alguns comentadores
televisivos conotados com o PSD (Marques Mendes, Manuela Ferreira Leite,
Pacheco Pereira, Marques Lopes).
Mas – atenção – isto
também é um mérito: saber fazer propaganda de si próprio, saber enganar os
pacóvios, saber ganhar a confiança do PR, saber lidar com a extrema-esquerda e
saber seduzir os media e os comentadores de outros quadrantes é uma arte.
Entretanto, toda
esta onda favorável foi criando a ideia de que este Governo é ótimo – quando na
verdade é péssimo.
O resultado da sua
ação será desastroso.
As reversões vão
atrasar imenso o país, a economia vai crescer menos do que no ano passado, a dívida
do Estado está em máximos históricos e o investimento privado em mínimos, o
investimento público desapareceu, os juros da dívida portuguesa subiram.
Mesmo em relação ao
défice pode haver muitas surpresas.
Mas isso só se
saberá lá para março.
E enquanto o pau vai
e vem folgam as costas.
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